Resumo

Uma das ferramentas para avaliar as condições de saúde da população é a expectativa de vida saudável. O objetivo deste estudo foi estimar a expectativa de vida saudável em idosos e adultos mais velhos da Bahia e grande região Nordeste. Trata-se de um estudo transversal, no qual foram empregados dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2019. Como proxy de saúde, utilizaram-se as prevalências de autopercepção do estado de saúde, desagregadas por sexo, para o estado da Bahia e região Nordeste, além de tábuas de mortalidade completas para o mesmo ano e localidades, desagregadas por sexo. Para a construção dos indicadores de expectativa de vida saudável foi utilizado o método de Sullivan. As estimativas de expectativa de vida saudável mostraram que, quanto mais velhos, menos se vive em termos absolutos e proporcionalmente com boa saúde, uma relação direta com a idade. As mulheres tendem a viver mais e com menos saúde, no entanto, as estimativas não foram estatisticamente significativas na perspectiva de gênero. Propiciar melhor saúde e vida para indivíduos idosos deve ser um dos principais objetivos das ações governamentais deste século, haja vista o acelerado processo de envelhecimento da população e o aumento da longevidade, tendo em mente uma perspectiva de ação durante todo o curso de vida, não se limitando às fases mais avançadas da vida.

Palavras-chave: Idoso. Saúde do idoso. Expectativa de vida ativa.

Resumen

Una de las herramientas utilizadas para evaluar las condiciones de salud de la población es la esperanza de vida saludable. El objetivo de este estudio fue estimar la esperanza de vida saludable en adultos mayores y ancianos en Bahía y la región del gran Nordeste (Brasil). Se trata de un estudio transversal en el que se utilizaron datos de la Encuesta Nacional de Salud de 2019. Como proxy de salud, se utilizaron la prevalencia de autopercepción del estado de salud, desagregada por sexo, para el estado de Bahía y la región Nordeste, y tablas de mortalidad para el mismo año y localidades, desagregada por sexo. Para la construcción de indicadores de esperanza de vida saludable se aplicó el método de Sullivan. Las estimaciones de esperanza de vida saludable mostraron que cuanto mayor es la edad, menos se vive en términos absolutos y proporcionalmente con buena salud, una relación directa con la edad. Las mujeres tienden a vivir más y con peor salud, sin embargo, las estimaciones no fueron estadísticamente significativas desde una perspectiva de género. Brindar una mejor salud y vida a las personas adultas mayores debe ser uno de los principales objetivos de las acciones gubernamentales en este siglo, dado el acelerado proceso de envejecimiento poblacional y el aumento de la longevidad, teniendo en cuenta una perspectiva de acción a lo largo del curso de la vida, no limitada a las etapas más avanzadas.

Palabras clave: Anciano. Salud de los ancianos. Esperanza de vida activa.

Abstract

One of the tools used to assess what is observed in terms of the population’s health conditions is healthy life expectancy. The aim of this study was to estimate the healthy life expectancy in older and elderly adults in Bahia and the Greater Northeast Region. This is a cross-sectional study, in which data from the 2019 National Health Survey were used. As a health proxy, the prevalence of self-perception of health status, disaggregated by sex, for the state of Bahia and the Northeast region, and complete tables of mortality for the same year and locations, disaggregated by sex. For the construction of healthy life expectancy indicators, the Sullivan method was used. Estimates of healthy life expectancy showed that, the older you are, the less you live in absolute terms and proportionately in good health, a direct relationship with age. Women tend to live longer and in poorer health, however, the estimates were not statistically significant from a gender perspective. Providing better health and life for elderly individuals should be one of the main objectives of governmental actions in this century, given the accelerated process of population aging and increased longevity, bearing in mind a perspective of action throughout the life course, not limited to the more advanced stages of life.

Keywords: Older adults. Older adult health. Active life expectancy.

INTRODUÇÃO

As condições de saúde das pessoas idosas estão cada vez mais no cerne das políticas públicas, diante das inúmeras mudanças demográficas e epidemiológicas que estão ocorrendo1. O que se observa em países de alta e média renda são indivíduos vivendo por períodos mais longos2. Concomitantemente, as doenças crônicas não transmissíveis passaram a ter maior peso no cenário de morbimortalidade3. Essas características induziram ao questionamento se os ganhos de expectativa de vida estão ou não sendo acompanhados de melhores condições de saúde4.

Há divergências na literatura quanto ao que se observa e o que esperar para o futuro. Nesse sentido, três teorias discorrem sobre essa temática. A teoria da compressão da morbidade descreve que os ganhos de longevidade serão acompanhados de mais saúde, com condições crônicas e incapacitantes contidas em idades mais avançadas5,6. Em contrapartida, a teoria de expansão da morbidade afirma que as pessoas viveriam mais, mas com piores condições de saúde7,8. De maneira intermediária, a teoria de equilíbrio dinâmico expõe que as pessoas viverão mais e que esse tempo será vivido com menos condições incapacitantes graves, porém convivendo com condições crônicas9.

Uma das ferramentas para avaliar as condições de saúde da população é a expectativa de vida saudável. Ela é um indicador que sintetiza informações de morbidade e mortalidade, demonstrando quanto tempo se vive de maneira saudável ou com alguma condição crônica e ou incapacitante10.

Para a construção da expectativa de vida saudável, é necessário que seja escolhida uma proxy de saúde para as estimativas. Uma variável amplamente utilizada é a autopercepção do estado de saúde, uma das principais formas de mensuração das condições de saúde entre a população idosa11. De forma simples e pragmática, essa forma de mensuração das condições de saúde está intimamente relacionada ao bem-estar e à qualidade de vida11,12. É um dos indicadores mais utilizados em sociologia, epidemiologia e estudos econômicos, fazendo parte de pesquisas de saúde e de outras áreas13.

Na literatura internacional e nacional há muitos estudos sobre expectativa de vida saudável, que abordam distintos desfechos de saúde, como: incapacidade funcional, autopercepção do estado de saúde e doenças crônicas14,15,16,17. O que boa parte dessa literatura sintetiza em seus resultados

é uma desvantagem feminina no que tange a esse indicador. Geralmente, as mulheres tendem a viver mais, porém mais tempo com doenças crônicas ou incapacitantes16,17. Apesar de o tema ser amplamente estudado, há poucas informações a nível regional, como unidades da federação.

Para o contexto do estado da Bahia, há estudos que buscam avaliar as condições de saúde da população envelhecida18, mas existe uma lacuna no que tange às estimativas de expectativa de vida saudável, um indicador com grande poder de síntese das condições de bem-estar ao associar morbidade e mortalidade nas suas estimativas, se configurando como uma ferramenta fundamental para a compreensão dos processos que ocasionam a expansão da morbidade ou o equilíbrio dinâmico, bem como para o entendimento sobre as diferenças de gênero e idade nesses processos. Para a formulação de políticas públicas na área de saúde visando maior prevenção e controle das condições de saúde, é necessária a construção de medidas resumo dessas condições, sendo a expectativa de vida saudável um importante constructo nessa perspectiva.

Diante do exposto, o objetivo deste estudo foi estimar a expectativa de vida saudável em adultos mais velhos e idosos da Bahia e grande região Nordeste, com base nos dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) do ano de 2019.

MATERIAL E MÉTODOS

DADOS

Trata-se de um estudo transversal, no qual foram empregados dados da PNS de 2019. A PNS é um inquérito de base populacional, com representatividade nacional, tendo como população-alvo pessoas com 15 anos ou mais de idade, residentes em domicílios particulares permanentes. É uma pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos anos de 2013 e 201919. A estratégia de amostragem de pesquisa foi dividida em três estágios distintos, configurando como uma amostra complexa.

Os quesitos dessa pesquisa foram coletados com base em três seções: a primeira se refere ao questionário contendo informações do domicílio e visitas domiciliares realizadas por agentes de endemias e equipe de saúde da família. Uma parte do questionário foi destinada a todos os moradores do domicílio, enquanto outra parte foi atribuída a um morador de idade igual ou

superior a 18 anos, que respondeu pelos demais (proxy), sendo investigados diferentes aspectos, como nível de escolaridade, informações sobre ocupação, rendimentos domiciliares, deficiência física e/ou intelectual, cobertura de planos de saúde, acesso e utilização dos serviços de saúde, saúde dos indivíduos com 60 anos ou mais e saúde de crianças com menos de 2 anos de idade. Por fim, a última seção se restringe a um morador selecionado, com 15 anos ou mais, respondendo perguntas sobre características de trabalho e apoio social, percepção do estado de saúde, acidentes, estilos de vida, doenças crônicas não transmissíveis, saúde da mulher, atendimento pré-natal, saúde bucal, atendimento médico, entre outras20.

VARIÁVEL DESFECHO

O desfecho empregado para mensuração das condições de saúde e cálculo da expectativa de vida saudável foi a autoavaliação do estado de saúde em pessoas com 50 anos ou mais. Os dados utilizados se referem ao estado da Bahia e à região Nordeste, para a realização de uma comparação entre as localidades.

O desfecho binário “autopercepção do estado de saúde” foi baseado no seguinte questionamento: em geral, como o(a) Sr(a) avalia sua saúde? Foram considerados com boa saúde aqueles que responderam “muito boa” e “boa”, e com saúde ruim aqueles que responderam: regular, ruim e muito ruim. Essa classificação foi empregada na literatura prévia11.

A autopercepção de saúde, apesar de ser considerada um quesito subjetivo, é tida como um dos principais indicadores para a averiguação das condições de saúde na população adulta e idosa, considerada preditora da mortalidade e incapacidade e estando atrelada à qualidade de vida dos indivíduos21. A informação de autopercepção de saúde é uma variável proxy de saúde amplamente empregada em estudos sobre a expectativa de vida saudável16 e tem validade quanto a sua utilização em estudos com abordagem análoga à deste trabalho22.

ANÁLISE DOS DADOS

Para a construção dos indicadores de expectativa de vida saudável foi utilizado o método de Sullivan23. Nesse método são combinadas tábuas de

mortalidade completas – para o ano de 2019, no estado da Bahia e região Nordeste, desagregada por sexo e idade, disponibilizada pelo IBGE24 – com as prevalências de doenças crônicas selecionadas e de autopercepção do estado de saúde na população nesse mesmo período. Trata-se de um dos principais métodos existentes para a construção de expectativa de vida saudável por meio de dados transversais, tendo a vantagem de obtenção de estimativas com dados amplamente disponíveis e com fácil interpretação4.

Define-se a expectativa de vida saudável, ou com bom estado de saúde, (bom estado de saúde autoavaliado) (EVSx) como:

EVSx =

Onde:

EVSx: a expectativa de vida com boa saúde representa o número médio de anos que serão vividos com estado de saúde autodeclarado como bom ou muito bom a partir da idade x;

: proporção de pessoas com boa saúde autodeclarada x a x+n;

: pessoas-anos vividos de x a x+n, que corresponde ao total de anos vividos pela coorte no intervalo;

lx: probabilidade de sobreviver até a idade x.

Foram selecionadas as estimativas aos 50, 60, 70 e 80 anos de idade para a exposição dos resultados, de modo a verificar diferenças, principalmente, no que tange à proporção do tempo vivido. A obtenção dos dados levou em consideração a amostragem complexa da PNS 2019. Foi aplicado o teste qui-quadrado de Pearson, com correção de Rao-Scott para verificar as diferenças significativas entre mulheres e homens em relação às prevalências utilizadas, bem como as diferenças existentes em termos de idade. Contudo, a análise por meio do método de Sullivan se deu mesmo quando não houve significância estatística. As informações sobre as prevalências e seus respectivos intervalos de confiança foram obtidas por meio do programa estatístico Stata, versão 14.0. As estimativas de expectativa de vida saudável foram construídas com o auxílio do programa Microsoft Office Excel 2019.

RESULTADOS

A prevalência total de boa saúde teve diferença estatisticamente significativa entre mulheres e homens do Nordeste (p-valor < 0,001), com maior

proporção para os homens. Todavia, não foi observada diferença para o estado da Bahia (p-valor = 0,056). As mulheres nordestinas com 50 anos ou mais tiveram uma prevalência de boa saúde de 35,4% (IC95%; 34,6-37,2) e os homens de 43,9% (IC95%; 41,9-45,9). Já para a Bahia, as prevalências foram 31,7% (IC95%; 27,1-36,7) e 39,0% (IC95%; 33,7-44,5), respectivamente (Tabela 1).

O que se observa nas prevalências por grupo etário, para mulheres e homens e para o estado da Bahia e o Nordeste, é um padrão geral, apesar de algumas oscilações, de queda da autoavaliação de saúde como boa com o avançar da idade. Dados mais aprofundados de todos os diferenciais podem ser visualizados na Tabela 1.

Outro padrão claro é uma melhor avaliação do estado de saúde dos homens em relação às mulheres, tanto para a Bahia quanto para o Nordeste como um todo. Com exceção de poucos grupos etários, os homens tendem a avaliar melhor sua saúde, apesar de essa diferença não ser sempre observada de maneira significativa em todo o grupo etário.

Não foram observadas, com base nos intervalos de confiança, diferenças significativas de autoavaliação de saúde entre as localidades avaliadas, tanto para homens quanto para mulheres. Ora o estado da Bahia apresentava maiores prevalências, ora a região Nordeste.

Com relação às estimativas de expectativa de vida saudável, os resultados para a Bahia evidenciaram uma diminuição do tempo vivido com boa saúde com o passar da idade. Os anos absolutos vividos de maneira saudável diminuem. Para além disso, em termos absolutos a queda é natural por se ter uma menor expectativa de vida restante, em termos relativos se observa essa diminuição. Para os homens, aos 50 anos, no ano de 2019, a expectativa de vida restante foi de 27 anos, dos quais 11,8 (IC95%; 7,9-16,3) são com boa saúde, o que representa 43,6% desse tempo. Já aos 80 anos, a proporção do tempo vivido com boa saúde diminui para 33,7%. Nessa idade, a expectativa de vida restante é de 8,1 anos, dos quais 2,7 anos (IC95%; 0,9-5,4) são vividos de maneira saudável (Tabela 2).

Para as mulheres, esse padrão também foi visto. Aos 50 anos, a expectativa de vida restante foi de 32,4, dos quais 31,5% são vividos de maneira saudável, ou seja, 10,2 anos (IC95%; 6,7-15,1). Aos 80 anos, a expectativa de vida restante foi de 10,2 anos, dos quais 1,9 anos (IC95%; 0,6-4,5), 18,9% do tempo restante (Tabela 2).

As mulheres tendem a ter maior expectativa de vida restante, menor expectativa de vida saudável e, por sua vez, maior expectativa de vida não saudável – em termos absolutos – do que os homens. Todavia, ressalta-se que não foi observada diferença estatisticamente significativa de gênero entre as estimativas de expectativa de vida saudável em cada idade ao observar os valores das estimativas dos intervalos construídos.

Os resultados para região Nordeste evidenciaram que, em 2019, aos 50 anos, os homens esperavam viver, em média, 26,9 anos restantes, dos quais 11,3 (IC95%; 9,9-13,0) com saúde. Já aos 80 anos, os homens esperavam viver 7,9 anos, dos quais 2,7 (IC95%; 1,8-3,8) de maneira saudável. As mulheres, também em 2019, aos 50 anos, esperavam viver, em média, 31,6 anos. Contudo, apesar da maior expectativa de vida, elas têm menor número absoluto de anos vividos de maneira saudável, vivendo 10,9 anos (IC95%; 9,3-12,8) dessa forma. Aos 80 anos, dos 9,7 anos de expectativa de vida restante, 3,4 anos (IC95%; 2,4-4,5) são de maneira saudável (Tabela 3).

Em termos proporcionais, também é observada para a região Nordeste, assim como para o estado da Bahia, uma expressiva queda do tempo vivido de maneira saudável para os homens com o avançar da idade. Por exemplo, aos 50 anos se esperava viver 42% do tempo de vida restante com boa saúde, contra apenas 33,9% aos 80 anos. Para as mulheres esse padrão não é observado, sendo bem semelhante à proporção dos anos vividos com saúde.

Aos 50 anos se espera viver 34,4% do tempo restante com boa saúde, contra 34,8% aos 80 anos (Tabela 3).

Assim como para a Bahia, não foi identificada diferença estatisticamente significativa entre as estimativas de homens e mulheres ao observar os intervalos de confiança da expectativa de vida saudável. O que se verifica são diferenças consideráveis entre as idades analisadas.

De modo geral, foram observados indícios de maiores estimativas de expectativa de vida saudável, em termos absolutos, para a Bahia em relação ao que foi visto para a região Nordeste, principalmente para as mulheres. Todavia, ao levar em consideração os intervalos de confiança das estimativas, essas diferenças não foram significativas.

DISCUSSÃO

Este estudo buscou estimar a expectativa de vida saudável em adultos mais velhos e idosos para o estado da Bahia e região Nordeste, com base nas informações da PNS do ano de 2019 – dados mais atuais no que tange aos inquéritos nacionalmente representativos. Os resultados descritivos mostraram maior prevalência de autoavaliação de saúde como “boa” para os homens, estatisticamente significativa apenas para a região Nordeste. Em termos de proporções por idade, há uma diminuição da boa saúde autoavaliada com o avançar dos anos, para ambas as localidades – padrão observado para mulheres e homens. As estimativas de expectativa de vida saudável mostraram que quanto mais velhos, menos se vive em termos absolutos e, proporcionalmente, com boa saúde, uma relação direta com a idade. As mulheres tendem a viver mais e com menos saúde. No entanto, as estimativas não foram estatisticamente significativas na perspectiva de gênero.

As mulheres tendem a apresentar pior avaliação do estado de saúde e, consequentemente, os homens exibem maiores prevalências de boa saúde, padrão observado em outros estudos25,16. Parte dessa diferença pode estar no papel das condições sociais e culturais, que se diferem por gênero, no que se entende por saúde. A cultura da masculinidade influencia na forma como os homens lidam com a saúde, de modo que um comportamento mais preventivo e assertivo quanto a práticas que possam contribuir para boa saúde nem sempre são visualizadas. Determinadas condições nocivas à saúde são

minimizadas e ignoradas pelos homens em razão da associação desses fatores como uma possível fragilidade masculina16.

Essa cultura da masculinidade gera muitos comportamentos prejudiciais à saúde, influenciando, por exemplo, no padrão de utilização de serviços de saúde. Os homens tendem a utilizar serviços mais especializados e de emergência. A literatura evidencia que a procura dos serviços de saúde pela população masculina está atrelada à presença de sinais, sintomas e doenças26. Ademais, ela também está atrelada ao fato de esses indícios influenciarem em algum nível no cotidiano de trabalho, que, na percepção masculina, tem um papel central na utilização em maior ou menor magnitude dos serviços médicos27. Desse modo, tornam-se essenciais como estratégias dos serviços de saúde, em especial a atenção primária, o desenvolvimento e o aprofundamento das ações educativas em saúde para compreender melhor esse contexto cultural e ocupacional masculino, de forma que possibilite mudanças nos hábitos de utilização dos serviços de saúde desse grupo28. Em contrapartida, as mulheres têm um padrão mais preventivo, levando a prognósticos mais precoces das doenças29,30, o que ocasiona menor letalidade. Por conseguinte, as mulheres passam a viver mais tempo com condições crônicas que, por sua vez, estão correlacionadas a piores condições de saúde17.

Os resultados deste estudo demonstraram uma diminuição da proporção do tempo de vida com boa saúde com o avançar da idade. Esses resultados corroboram a literatura sobre o tema31,16,17. Muitos problemas de saúde aumentam sua prevalência e incidência com a idade e, por sua vez, estão associados ao estado de saúde. Entre eles, as doenças crônicas não transmissíveis se destacam, haja vista que têm maiores prevalências na população idosa32. As doenças crônicas estão associadas à autopercepção de saúde, à incapacidade funcional e à qualidade de vida associada à saúde33. Portanto, quanto mais velhos, mais condições crônicas e incapacitantes que influenciam no estado de saúde dos indivíduos e na expectativa de vida saudável surgem.

Neste estudo não houve diferenças significativas da expectativa de vida saudável entre homens e mulheres. Outros estudos encontraram essa diferença, usando como variável de saúde a autopercepção ou outras mensurações, como incapacidade funcional e doenças crônicas34,31,17. Nessas pesquisas é mostrado que as mulheres vivem mais, contudo, convivem com piores condições de

saúde, seja com maior período de vida com incapacidade, doença crônica ou pior estado de saúde autoavaliado.

As evidências da literatura concordam com o que é definido como male-female health-survival paradox35, que descreve que as mulheres vivem mais, têm maior longevidade, mas essa longevidade é acompanhada de um maior tempo de vida com condições crônicas em comparação com os homens36 – elas têm maior tempo de exposição a essas condições crônicas.

Relacionada aos diferenciais de sobrevivência entre mulheres e homens, outra explicação se refere a uma possível seletividade. Os homens experimentam maior mortalidade ao longo da vida, podendo gerar, em idades mais avançadas, grupos de indivíduos mais selecionados e com certa homogeneidade. Em contrapartida, as mulheres mais idosas tendem a apresentar mais heterogeneidade, acarretando mais tempo vivido com mais fragilidades e piores condições de saúde37,16.

Outra fonte de explicação se apoia nos diferenciais sociais, econômicos e culturais aos quais homens e mulheres são expostos de maneiras distintas ao longo da vida38. São observadas muitas distorções socioeconômicas de gênero com mulheres mais velhas, por exemplo, apresentando menores níveis de escolaridade e desigualdades na distribuição das ocupações. Com relação às distinções culturais, as mulheres têm, historicamente, o papel de responsáveis pelas tarefas domésticas, pela criação dos filhos e pelas condições de saúde e de vida da família, gerando desgastes e fatores estressantes que contribuem para piores cenários de saúde39.

O estudo apresentou algumas limitações e pontos positivos a serem destacados. O método de Sullivan não permite que possíveis mudanças nas taxas de mortalidade e nas condições de saúde sejam incorporadas às estimativas. Todavia, ressalta-se que não é um problema referente ao método empregado, mas sim à construção de tabelas de sobrevivências de período. Isso, no entanto, não influencia na confiabilidade das estimativas caso não existam mudanças repentinas nas condições de saúde e mortalidade. Ademais, o tamanho dos dados do desfecho para a Bahia, desagregados por sexo e idade, são limitados e podem ter influenciado na significância das comparações feitas. Ressalta-se como ponto positivo o desenvolvimento de estimativas mais regionalizadas, que possibilitam maior compreensão das condições de saúde dos indivíduos

mais envelhecidos em relação a resultados para todo o Brasil, haja vista a grande heterogeneidade social, cultural e econômica do país.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo teve como objetivo estimar a expectativa de vida saudável, por meio da autoavaliação do estado de saúde, para pessoas com 50 anos ou mais, tanto para a região Nordeste quanto para o estado da Bahia. Os resultados mostraram, principalmente, uma diminuição da expectativa de vida saudável com o avançar da idade, evidenciando uma piora das condições de vida com o passar dos anos. As políticas públicas devem se basear nas estimativas de vida saudável que se configuram como uma importante ferramenta de síntese das condições de saúde dos indivíduos. Propiciar melhor saúde e vida para pessoas idosas deve ser um dos principais objetivos das ações governamentais deste século, haja vista o acelerado processo de envelhecimento da população e o aumento da longevidade, tendo em mente uma perspectiva de ação durante todo o curso de vida, não se limitando às fases mais avançadas da vida.

COLABORADORES

1. Concepção do projeto, análise e interpretação dos dados: Wanderson Costa Bomfim.

2. Redação do artigo e revisão crítica relevante do conteúdo intelectual: Wanderson Costa Bomfim.

3. Revisão e/ou aprovação final da versão a ser publicada: Wanderson Costa Bomfim.

4. Ser responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Wanderson Costa Bomfim.

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Recebido: 1.6.2022. Aprovado: 4.1.2023. Publicado: 28.2.2023.